quarta-feira, 26 de maio de 2010

O FIM DE LOST



Quando eu paro pra pensar em 59 países assistindo, simultâneamente, ao mesmo programa, e tantas outras pessoas no mundo, pela internet, chorando ou quebrando a cabeça tentando entender o series finale de Lost, eu não consigo pensar em outra coisa: 'Estou presenciando uma fase de transição'. A transição para uma nova forma de ver TV.

Assisti ao series finale anteontem e ainda não sei se consigo escrever sobre ele. Ao término do episódio, eu simplesmente congelei. Fiquei mudo, estático, olhando pro nada. Dentro de mim, porém, uma movimentação intensa. Pensei: 'Espera ai, o que aconteceu? (WTF)'. Precisei voltar os 18 minutos finais. A ficha caiu. Voltei então algumas cenas pra trás e exclamei um palavrão que vou substituir pela palavra 'GENIAL'.

Já disse em outros posts, que Lost sempre foi centrado no conflito entre Fé e Razão. Pois bem, o encerramento da história se deu pela Fé. Teve gente que não gostou, mas neste grupo temos dois tipos de pessoas: O primeiro grupo entendeu, mas não aceitou. O segundo, simplesmente não entendeu.

Vamos lá, se você não entendeu: Os 'FlashSideways', ou a realidade paralela, que embalou esta temporada, era uma espécie de purgatório. Nos FlashSideways, eles estão mortos. E pra que serviu tudo aquilo? É como se a vida precisasse te contar a mesma história (a história de sua vida) de outra forma, para que você compreendesse o porque e a razão das coisas terem acontecido daquela maneira. Nesta realidade paralela, sua vida alcança um sentido e você alcança a sua redenção. Benjamin acredita que ainda não esta pronto e por isso decide que ainda deve permanecer nela. Os demais, caminham rumo a Luz. Seria aquilo o Céu? O Paraíso? Provavelmente. E olha que curioso, o céu não é um campo de golfe, nem um espaço verde infinito com crianças jogando bola de um lado pro outro. Na verdade, é um estado de espírito de total compreensão e felicidade completa, perto daquilo e daqueles que foram importantes durante a sua vida. 'Por isto estão todos aqui, você precisa de todos eles e eles precisam de você' é o que Jack ouve de seu pai morto. Por isso, Charlie reencontra Claire e Aaron, por isso Sayid encontra Shannon, por isso Locke, enfim, se levanta da cadeira de rodas. Tudo o que lhes fora importante em vida lhes é concedido, uma vez redimidos. Todas as situações dos flash-sideways, compõem um epílogo da saga que acompanhamos na ilha (vale ressaltar, tudo na ilha aconteceu de verdade, eles estavam vivos).

Ta. Mas, e a Dharma? E o coração da Ilha? E a fumaça preta? De fato, a mitologia de Lost não é diferente de todas as outras mitologias. É um campo aberto para diversas reflexões, seja ela científica, filosófica ou religiosa. Há uma Luz ou uma Força. Para alguns ela pode significar Fé, Amor, Esperança. Para outros pode significar 'buracos de minhoca', 'efeito casimir', 'máquina de fazer dinheiro'. O fato é, existe uma luz que é a origem metafísica do mundo. Os homens de fé a protegem e os da razão querem explorá-la. A Iniciativa Dharma buscou entender o poder da ilha. Estudando a origem metafísica do mundo, presente no núcleo da Ilha, teríamos a ciência total do Universo e do Homem. Uma das descobertas foi a possibilidade de viajar no tempo. E este recurso foi utilizado na narrativa para que pudessemos conhecer mais sobre a história da Ilha, da Dharma e dos personagens. Foi assim que descobrimos que a Dharma dividia o território na Ilha com os 'Outros', ou os homens de fé, liderados por Jacob, o protetor espiritual da Ilha. Numa dessas viagens no tempo, descobrimos que Ben (que pertencia a Dharma) extinguiu toda a comunidade científica para se juntar aos 'Outros'. Depois disso, desabilitou as estações  para que a Ilha não fosse localizada e explorada novamente. Porém, um dia, Desmond deixou de teclar os 'números', o que permitiu que a Ilha fosse localizada por Wildmore, que foi buscar o acerto de contas com Ben.

Falando em números, o que seriam eles? No jogo de Lost e fazendo uma pesquisa pela internet, descobrimos que os números fazem parte de uma equação, que pretende calcular uma constante, responsável por manter o mundo livre do Caos. Talvez por isso sejam utilizados pela Dharma nas escotilhas e nas estações. E também utilizado por Jacob para numerar seus candidatos.

E afinal, por que eles foram parar na Ilha? Jacob escolheu a cada um deles, por razões diversas, para que um deles fosse seu substituto, como protetor da Ilha. Esperava dar a cada um deles, uma nova chance, uma segunda oportunidade na Ilha. Desde o princípio, Lost foi uma série sobre pessoas: uma ladra-assassina, um médico-viciado, um músico-drogado, um pilantra, um deficiente físico, enfim, pessoas. Pessoas que traziam dentro de si o bem e o mau, com uma existência vazia e errante, e que encontraram na Ilha uma oportunidade de começar do zero. Apagar seu passado e assumir uma nova persona pra si e para os outros. Através de Flash-Backs íamos conhecendo os seus passados e como eles estavam intimimanente interligados. Podíamos prever, desde o princípio, que deveria haver uma razão pra tudo aquilo. E esta razão, era Jacob.

E Jacob? Quem ele é? Deus? Bem, ele morreu, então não é Deus. Seria um intermediário, um profeta, um guardião, um semi-deus? Descobrimos que Jacob e o Homem de Preto são irmãos. E foi dali que nasceu o conflito entre Fé e Razão. E, involuntariamente, Jacob liberta o mal (ou a fumaça preta). Torna-se sua tarefa, portanto, evitar que o mal (seu 'irmão') apague a Luz. Essa mitologia explica muita coisa, mas muita coisa mesmo a respeito da série.

Porém, o episódio final frustra muita gente, quando justamente deixa essa mitologia toda em aberto. Não temos detalhes como: 'De onde veio a mãe de criação dos dos irmãos, a primeira nativa da ilha?', 'O que é aquela luz?'. Enfim, muita gente sentiu falta da ciência explicando as coisas e alguns elementos incomodaram até mesmo os 'homens de fé, como eu, por exemplo: eu esperava uma estrutura mais primária para abrigar a luz, uma rolha de pedra e toda aquela estrutura me pareceu muito estranho. Mas, veja bem, é um campo em aberto. Podemos tentar explicar a mitologia de Lost, com conceitos de física-quântica, filosofia ou religião. Os criadores optaram por deixar a mitologia em aberto, justamente para que cada telespectador prencha, a sua própria maneira,  os buracos que ficaram. Afinal, de onde vem Deus? Ele existe? É aceitável pela fé? Ou podemos entendê-lo racionalmente? Não sabemos. É uma resposta que cada um deve buscar por si, é pessoal. Lost não poderia nos dar essa resposta. Não seria Lost. Conhecedores desta verdade, não estaríamos mais 'perdidos'. Lost respondeu o suficiente para que ainda viva em nosso imaginário.

Agora que conhecemos a história (ou boa parte dela), podemos assistir tudo novamente, com um novo olhar. Certamente, entenderemos de uma maneira melhor e mais completa. E como não dizer 'Obrigado' ? Todos os dias, somos tratados como idiotas pela televisão, que subestima a capacidade de seu telespectador. Lost nos presenteia com uma narrativa complexa, que nos obriga a pensar, ler, estudar, discutir e calar. E no fim de tudo isso, conseguiu nos emocionar. Acredito que até mesmo os homens da razão, sentiram um arrepio ou um marejar no olho quando todos os personagens se recordaram, entenderam a sua existência e se encontraram no fim.

Se eu faria diferente? Algumas coisas. Sim! Mas não mudaria uma vírgula na luta entre FLocke e Jack. Não precisou de efeitos especiais elaborados, espadas brilhantes, nem de bombas. Toda a tensão criada ao longo da série estava presente ali. Vamos as críticas. Não me crucifique, mas preciso fazer alguns comentários engraçados. Mais alguém ai se lembrou dos 'aerolitos' do Chapolin quando as pedras caiam durante os tremores de terra? Alguém ficou com medo de entrar um 'Sei lá, sei lá, a vida é uma grande ilusão....eu só sei que ela esta com a razão', naquela cena final na Igreja?

Enfim, tem muita coisa pra se falar de Lost, mas pra finalizar, a série foi um grande jogo. Um gigantesco quebra-cabeça. As ultimas peças necessárias para montá-lo nos foram dadas. Agora precisamos organizar cada peça e encaixá-las. O mais bacana é que não existe uma única maneira de montá-lo, existem várias. Algumas coisas nos são impostas, outras estão abertas para interpretações pessoais. Uma coisa continua sendo única, independente se você é um homem de fé ou da razão: A história de cada personagem. Uma história que também é nossa. Uma mensagem e uma reflexão. Queria poder comentar algumas cenas, no entanto, acho que já me alonguei demais. Quando a emissora solicitou aos roteiristas que criassem Lost, eles buscavam uma mistura de 'Survivor' com 'Naufrago'. O que ganhamos vai muito além de tudo isso. Alguns momentos deste series finale continuam na minha memória, como o renascimento de Aaron e o reencontro de Charlie e Claire, bem como a cena de despedida entre Hurley e Jack, antes do médico descer a caverna. E os flash-backs, quando os personagens entendiam o significado de suas vidas? E o que dizer da cena final? Lost, a principio, se chamaria 'The Circle' (O círculo). Embora a série termine no mesmo local em que começou, o contexto é totalmente outro. Ao abrir os olhos em meio ao bambuzal, no primeiro episódio, Jack encontrava ali a sua segunda chance. Ao cair  morto, no mesmo local, no episódio final, ele tinha plena certeza de tarefa cumprida. Em algumas palavras: Lindo, Genial, Épico! Uma bela jornada.

I ll se you in another life, brother!!!

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